tô bem!
ser a (ou uma das) pessoa principal para a existência de outra pessoa, me atravessou (vessa) tão profunda e irremediavelmente que virou assunto principal em todas as trends da minha vida, o grande enigma.
vazaram um buraco em mim, cada qual a nidar no meu por dentro, que nunca mais fechou e não sei também por onde abre, só sei que vez por outra dói muito, por ruim ou por bom. parece que só sendo furada a mãe, a função pode o possível para cada díade, para cada uma pessoa a fazer advir outra. mesmo que ela tenha mais de uma, vai ser sempre uma mãe para cada sua criança, o babado é no um a um.
não se ama duas pessoas igualmente. não é possível. ama-se como se pode amar, e a partir da alquimia do encontro, e a responsabilidade de manejar o que for preciso pra esse amor se viabilizar é das pessoas grandes, as pequenas nem não são pessoas-pessoas ainda, estão aprendendo a ser gente, advindo.
doar tempo, doar o tempo todo alma, fôlego, instilar vida nas narinas entupidas ou sem força, só suspiro, que isso de suspirar assim, meu deus. e lá tem profundidade de alma que chegue pra tanto ar ficar de fora pra dentro, de dentro pra fora, e passa a mão na cabeça. alguém precisa conversar com eles, saber o que está havendo. chama lá, chama ela. queima tudo nesse grito aí porque ela tá sempre com trap lá em cima. mas é só ela quem resolve? só com ela mesmo.
broto, e ser convocada na função é sempre e apenas para me deparar com algo que precisa ser lidado por, nada mais nada menos que, mamãe. aí, coloco minha melhor cara de competência e bailo. inebriante. ambivalente. assustador como vai ficando escasso enquanto eles passam a investir em si mesmos, igual mamãe ensinou.
questionamentos, indagações, limites de incompreensão, onde não entender dói tanto quanto doeria podê-lo. foda. o mundo cheio de outras pessoas faltosas, furadas, humanas, tratadas e não tratadas. racismo, misoginia. devastação da porra da natureza. a natureza, gente. respeita a mãe.
há vezes em que o linguajar materno me toma e a doma possível é a coisa sair na palavrona transgressoa mesmo. fico cansada de polir todas as palavras à saída.
ser a testemunha materna da vida dela e dele, cuidar dessas pessoas que são outras das que saíram de mim, é tão tátil que, para suportar, preciso exportar, lançar mão do quarto elemento, da literatura, e me derreter inteira em palavras que lhes contem, no corpo primeiro e depois no coração, como me emociona a troca entre nós.
tenho em minha casa duas pessoas carregadas de traços, pedaços e reverberações de mim e do amor investido em ato ético de cuidado imperfeito. uma delas que cata a caixa de ovos quando vem do mercado, porque no verso da embalagem de papel com a marca tem um caça palavras. essa mesma pessoa recolhe esse isso, caça-lhe as palavras no banheiro, que às vezes usa pelos fins utilitários mesmo, mas vezes só para pensar um pouco. tipo quem abre a geladeira sem saber o que quer quando o faz.
quem mais vai saber disso além de nós? o privilégio de estar perto o suficiente para testemunhar e desejar a história que outra pessoa vai escrevendo e contando e realizando de si, comigo, desde antes de ter umbigo.
p.s. notem que essa pessoa é apropriada a tal ponto das próprias palavras que as torna palavras próprias, acrescendo à lista aquela que se joga na cara, mas não foi devidamente notada. bolo. se quiser vir, vem. ela escreve no mundo o que tem.
elis/barbosa
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